[News] ENTREVISTA | Uma conversa sobre os desafios de solidão do homem preto homossexual com escritor e dramaturgo Ronaldo Fernandes, autor do romance “Amâncio”

 

Em “Amâncio” (Editora Paraquedas, 102 págs.), o escritor e dramaturgo pernambucano Ronaldo Fernandes  (@ronfernadis) traz a tona o tema delicado da solidão do homem negro homossexual a partir da tragetória do personagem que dá nome à obra. Ao longo dos capítulos, Amâncio são descobertos fragmentos das memórias do personagem, trazendo em seus relatos experiências que por vezes esbarram em violências assentadas no racismo, machismo e homofobia. A obra, pensada primeiramente como obra teatral, é uma mistura de relatos ficcionais e vivências reais, contadas pelo tio do autor, com quem ele conviveu dos 3 aos 17 anos.


Ronaldo Fernandes é natural de Paudalho, cidade da Zona da Mata de Pernambuco. Ainda adolescente mudou-se para Santos, em São Paulo.  É bacharel em Administração de Empresas e diretor de operações em uma empresa de tecnologia. Ao mesmo tempo dedica-se à área cultural. É pós-graduado em direção e atuação teatral, além de ator, dramaturgo e escritor. Fundou em Santos a Cia Trilha de Teatro e integra o Grupo Tescom de Teatro, coletivos artísticos da região da baixada santista. Em sua trajetória no palco e bastidores, atuou em mais de uma dezena de espetáculos, entre eles: 50+- o Game da Memória, O Plano, Benjamin - o Filho da Felicidade, Casamento de Sangue em Santos, Nó Na Garganta, Mac & Beth – Eleição e confusão na Pequeno Rei e Romeu e Julieta: Um romance de virar a cabeça. 


Em sua carreira de autor, lançou, antes de “Amâncio”, a obra “Avôa”, uma coletânea de histórias inspiradas na memória do autor com a avó.


Confira abaixo a entrevista completa com o autor


Quais são os temas centrais de “Amâncio” e por que você escolheu abordá-los?


A construção da identidade de um homem negro, nordestino e homossexual que viveu abusos, violências, solidões e racismos. Escolhi abordar esses temas porque, por meio da história do meu tio, Amâncio, eu poderia contar a história de tantos  homens negros, nordestinos e homossexuais que sofreram abusos e violências sem que os reconhecesse com tais.


Por que você escolheu escrever essa história como um romance fragmentado?


Tendo o livro um personagem central, que é o “Amâncio”, que tem memórias reais e ficcionais da minha convivência com meu tio, escolhi o gênero romance, mas um romance que é fragmentado, aliás, a fragmentação sempre foi uma característica minha como dramaturgo que acabei levando para a literatura


O que te motivou a escrever esse livro?


O livro nasceu num período em que estive doente e precisei me isolar. Esse isolamento me trouxe perdas, inclusive de amigos queridos que não entenderam a minha ausência e isso me lembrou meu tio, que apesar de estar sempre rodeado de amigos, me pareceu solitário na negação da sua sexualidade. Resolvi que deveria ter uma conversa, um diálogo, via um livro em formato de diário, com o meu tio. Nesse mesmo período de absoluta fragilidade, solidão e isolamento, a Tainã Bispo, minha editora, me fez um convite para estar na FLIP e devido a doença, não pode estar e isso aprofundou o meu isolamento, daí lembrei da solidão do meu tio e resolvi escrever esse livro para para meu tio, mas também para mim. Escrevi memórias reais (ouvidas de pessoas próximas ao meu tio) e ficcionais. Meu tio participou ativamente da construção da minha identidade, mas nós nunca tivemos um diálogo franco e aberto e foi isso que busquei no livro. Foi um processo doloroso, pois escrevi o livro enquanto enfrentava problemas de saúde, aliás, a doença foi motivadora para a escrita. 


E o que esse livro representa para você?


Representa a compreensão do meu tio, após a sua morte. Nunca pude compreendê-lo em vida, mas quando fiquei doente, percebi o quanto não havia entendido meu tio. Ele já havia sido inspiração de uma peça teatral, criada na pandemia, que também tem o título de “Amâncio”. Esse livro, assim como a peça “50+- O Game da Memória” são passos iniciais para a saída do meu isolamento forçado por uma fragilidade de saúde. 


Você escreve desde quando?


Sempre lembro de eu escrevendo. Lembro que em Carpina, quando cursava a terceira série primária, como era chamado naquela época, escrevi uma redação que ficou entre as finalistas de um concurso promovido pelo estado. Infelizmente não lembro qual o concurso, só lembro da professora me dizendo isso. Agora, dramaturgias, eu escrevo há muito tempo, a minha primeira peça encenada foi em 2015 e se chamava Nó Na Garganta, uma produção do Grupo Tescom de Teatro, um coletivo artístico da Baixada Santista, do qual faço parte e que acabamos de estrear “50 + - O Game da Memória” com textos meu e dos outros atores e com direção da Verônica Gentilin da Cia Mugunzá de Teatro.


Quais são suas influências artísticas e literárias?


As minhas leituras sempre foram mais relacionadas à dramaturgia, livros técnicos mesmo, porém acredito que, embora “Amâncio” tenha pouco diálogo com eles, Clarice Lispector, Fernando Pessoa, Itamar Vieira Junior, Nelson Rodrigues, Jeferson Tenório, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto e Ariano Suassuna. Não posso afirmar qual autor influenciou diretamente na minha escrita.


Quais são os seus projetos atuais de escrita? O que vem por aí?


Eu, junto com meu grupo de teatro, o Tescom, acabamos de estrear o 50+- O Game da Memória, onde estou como um dos autores e também ator e nosso plano é entrar em temporada com o espetáculo e também estou no projeto “Celebrando a escrita” uma coletânea de contos da editora Paraquedas.


Adquira “Amâncio” pelo site da editora Paraquedas:

https://www.lojadaclara.com.br/amancio-ronaldo-fernandes 






Nenhum comentário