Mais que generoso, o tempo está sendo justo. O 11º álbum dos Engenheiros do Hawaii ressurge agora, pela primeira vez em vinil — duplo —, para ampliar sua reputação como cultuada joia da discografia folk/rock brasileira. Era um velho anseio dos fãs. Lançado em maio de 1999, o trabalho marcou a estreia do grupo pela Universal Music Brasil e a maturidade da formação com o líder Humberto Gessinger com Luciano Granja (em trabalho de guitarras excepcional) e Adal Fonseca (bateria), potencializada pela chegada do tecladista Lúcio Dorfman. O sucesso de público foi imediato, puxado pelo clássico instantâneo “Eu Que Não Fumo” e pela impactante regravação de “Negro Amor”, versão de Caetano Veloso e Péricles Cavalcanti para “It’s All Over Now, Baby Blue”, de Bob Dylan. Seis meses depois de lançado, o disco já contabilizava 60 mil cópias vendidas. A nova versão em vinil já está disponível na UMusic Store. Saiba mais aqui: https://www.umusicstore.com/engenheiros-do-hawaii .
Gravado no Rio de Janeiro, em meio ao carnaval — Humberto conta que eles deixavam as TVs do estúdio ligadas, transmitindo os desfiles, sem som, para reforçar o sentimento de estranheza, de serem “visitantes de outro mundo”, algo bem Engenheiros do Hawaii —, “¡Tchau Radar!” foi remasterizado em Los Angeles. O resultado é uma sonoridade folk excelente, com timbragem vintage e punch certeiro nas canções que exigem contundência rock. Não por acaso é apontado como o disco dos Engenheiros que melhor funciona como cartão de visitas para o público estrangeiro.
Em três gravações, os arranjos de cordas fazem imensa diferença. “Até Mais”, que começa com piano elétrico Rhodes e discreta programação eletrônica, ganha grandiloquência com a orquestração escrita por Eduardo Souto Netto. O maestro também colaborou em “Seguir Viagem”, abertura do segundo disco que dá espaço para os pendores progressivos da banda. E no fecho de ouro do disco, “Cruzada”, clássico de Tavinho Moura e Márcio Borges lançado por Beto Guedes em 1979, ganha luxuoso arranjo orquestral de Jaques Morelenbaum, com vinte músicos eruditos “dobrados”.
O repertório, coeso, tem outros destaques inspirados. “Concreto e Asfalto” é uma balada densa, com desenhos melódicos simples e letra estradeira que resume a alma do disco: “Não vou ficar, não vou ficar/ Fiz bandeira desses trapos/ Devorei concreto e asfalto”. “Nada Fácil” remete aos melhores momentos do pós-punk, com tensão e elementos surpresa, como o piano martelado à moda Stooges. A letra destila o melhor da acidez inteligente de Gessinger: “Tchau, radar!/ Eu vou saltar!/ Não é fácil, cara/ Euforia e depressão/ Muitas flores no caminho/ E uma pedra em cada mão”. “O Olho do Furacão”, com órgão jovem-guardista, tem o papo filosofia que transcende: “Estamos no centro/ por dentro de tudo/ no olho do furacão/ Estamos por dentro de tudo que gira/ Na mira do canhão”.
E não falta alívio romântico: a delicada “3x4”, escrita por Humberto para sua mulher, Adriane, acrescenta uma linda gaita (tocada por Iran Alves) para comentar versos cândidos como “feitos um pro outro/ feitos pra durar/ uma luz que não produz/ sombra”. Quase vinte e seis anos depois, “¡Tchau Radar!” se revela de forma semelhante, como obra de longa vida e encantos que se renovam.
Pedro Só
Fevereiro de 2025
Lista de faixas “¡Tchau Radar!”
Disco 1:
Lado A:
1) “Eu Que Não Amo Você” (Humberto Gessinger)
2) “Negro Amor” (“It’s All Over Now, Baby Blue” — Bob Dylan)
Versão: Caetano Veloso e Péricles Cavalcanti
3) “Concreto e Asfalto” (Humberto Gessinger)
Lado B:
1) “Até Mais” (Humberto Gessinger)
2) “Nada Fácil” (Humberto Gessinger, Lúcio Dorfman, Luciano Granja e Adal Fonseca)
3) “O Olho do Furacão” (Humberto Gessinger)
Disco 2:
Lado A:
1) “Seguir Viagem” (Humberto Gessinger)
2) “10.000 Destinos” (Humberto Gessinger e Lúcio Dorfman)
3) “Na Real” (Humberto Gessinger)
Lado B:
1) “3 x 4” (Humberto Gessinger)
2) “Melhor Assim” (Humberto Gessinger e Luciano Granja)
3) “Cruzada” (Tavinho Moura e Márcio Borges)
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