[Resenha] Pela Boca da Baleia

Sinopse: No ano de 1635, a Islândia é um pedaço de terra esquecido no meio do oceano gelado, obscurecido pela superstição, pela pobreza e pela crueldade. A curiosidade científica dos homens se confunde com magia e misticismo: alguns admiram o chifre dos unicórnios, os mais pobres idolatram a Virgem em segredo, e tanto livros quanto homens são jogados às fogueiras. Banido para uma ilha inóspita por práticas pouco convencionais da medicina, o velho curandeiro Jónas Pálmason recorda passagens dramáticas de sua vida, como as mortes de três de seus filhos, o exorcismo de um cadáver ambulante e o triste fim de um grupo de baleeiros espanhóis, massacrados pela população de uma vila pesqueira. Pela boca da baleia, do renomado autor e letrista islandês Sjón, é uma evocação mágica e envolvente de uma mente brilhante e de uma era há muito esquecida.

O que eu achei?
Em “Pela Boca da Baleia”, Sjón nos conta a história do naturalista exilado Jónas Pálmason, acusado de feitiçaria. Somos levados por suas lembranças pela voz do próprio Jónas, conhecido pela alcunha de O Erudito. Solitário, isolado e sem muitas esperanças, a história nos mostra uma época sombria e perigosa da Islândia de 1600.
Era a Reforma Protestante que chegava nas terras geladas da Islândia, e trazia consigo perigos inimagináiveis. A história desse livro une religião e mitologia, ciência e fé, tudo isso tão próximos uns dos outros que é impossível enxergar o limiar que os separa – pode parecer absurdo para nós do século XXI, mas não para aquela época. Jónas, um naturalista apaixonado por sua área, por vezes mistura a medicina e as descobertas mais objetivas da área com o misticismo e a mitologia local.


E época era perigosa para a religião cristã, que foi banida, e todos os seus conceitos caíram por terra.
Recriando o mito bíblico de Jonas e a Baleia, a escrita de Sjón é extremamente poética – visto que ele é um poeta e letrista inigualável -, e nos leva em uma viagem extraordinária, que mistura alucinações, surrealismo e arte, com uma estética que se aproxima às visões de Dalí. Muito longe de ser um hino de adoração a Islândia, a história trata da ganância e do fanatismo, da fé cega e da fome pelo poder, que foi piorada imensamente pela revolução que aconteceu. Pessoas simples se tornaram bárbaros por motivos torpes, acreditando em fofocas e falsos discursos baseados em superstição.


A mistura das lembranças de Jónas com a realidade fantástica, o naturalista nos conta a trajetória de sua vida cheia de momentos de extravagantes acontecimentos: exorcismos, cataclismos, barbárie; tudo isso mostrando o seu amor pelo conhecimento, e nos dando um retrato dos perigos que uma submissão intelectual e religiosa pode causar a uma população. O livro é de uma estranheza linda, extremamente emotivo e com direito a momentos irreverentes, onde a ciência e a mitologia se enfrentam de frente.

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