[Crítica] Histórias Assustadoras Para contar no Escuro

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Sinopse:
A cidade de Mill Valley é assombrada há décadas pelos mistérios envolvendo o casarão da família Bellows. A jovem Sarah (Kathleen Pollard), uma garota problemática que mantinha um relacionamento ruim com os pais, foi ao porão para escrever um livro repleto de histórias macabras. Décadas mais tarde, um grupo de adolescentes descobre o livro e passa a investigar o passado de Sarah. No entanto, as histórias do livro começam a se tornar reais.


O que eu achei?
[DISCLAIMER: para ser justo com a produção, vale salientar antes de começar a minha crítica que a projeção da cabine não foi a ideal para o filme — ocasionando com que alguns planos ficassem muito mais escuros do que deveriam.]

Durante o decorrer desse ano, eu venho estudado obras de terror direcionadas ao público infanto-juvenil e suas particularidades. Por conta dessa pesquisa, eu invariavelmente precisei me debruçar sobre o livro ‘Histórias assustadoras para contar no escuro’. Lançado em 1981 por Alvin Schwartz, o livro consiste em uma coletânea de variados tipos de narrativas — de letras de músicas a poemas — com apenas um propósito: assustar seus jovens leitores. A miscelânea dos escritos não possui cronologia definida ou relação de causalidade entre si, e se transformou em um clássico referenciado até os dias atuais. Seu principal mérito, dentre vários, foi o resgate das narrativas folclóricas e a apresentação de certas criaturas mitológicas (como o wendigo) a geração de jovens dos anos 1980. Muito dos livros que vieram em seguida como as coleções 'Goosebumps' e ‘Rua do Medo’ ambas do R. L. Stine e, ainda, as obras que compõem 'American Chillers' e ‘Michigan Chillers’ do Johnathan Rand (ainda inéditos no Brasil) carregam muitas reminiscências do livro de Schwartz (tanto do original, quanto de suas duas continuações).

Todavia, por mais que os escritos medonhos consigam construir a atmosfera enervante necessária para o gênero, o aspecto mais marcante de ‘Histórias...’ é, sem sombra de dúvidas, as ilustrações feitas por Stephen Gammell. Através de seus desenhos macabros, o ilustrador deu vida às inimagináveis criaturas dos contos e marcou (ou traumatizou?) o imaginário de vários leitores — geralmente, sendo o primeiro elemento destacado quando o livro é relembrado. Aqui no Brasil, o primeiro livro foi publicado pela editora José Olympio e possui as ilustrações realizadas pelo Brett Helquist para o relançamento da obra em 2011. Infelizmente, as ilustrações originais nunca chegaram por aqui.




Quando descobri que seria produzida uma adaptação cinematográfica da obra, eu fiquei animado e receoso na mesma medida. Por seu aspecto antológico, esperava-se (ao menos, eu) que os livros fossem adaptados para uma minissérie. Contudo, com a participação de Guillermo del Toro tanto na produção quanto na história, o que poderia dar errado, não é mesmo? Afinal de contas, ninguém melhor do que o del Toro para conseguir adaptar das páginas do livro para as telonas as horripilantes criaturas imaginadas por Schwartz e Gammell. Fiquei mais tranquilo.

Mas não deveria.

A direção do norueguês André Øvredal é bastante competente. Curto o seu estilo de direção e penso que suas obras anteriores ('O Caçador de Troll' (2010) e 'A Autópsia' (2016)) mostram seu domínio em construir tensão e alcançar verossimilhança não importando o quão absurda é a premissa. Quero destacar duas sequências, onde ele é bastante efetivo tanto em sua direção quanto na estética: o trecho envolvendo um personagem e um corredor vermelho em um hospital; e o desenrolar de uma noite dentro de uma cadeia. A transposição das criaturas monstruosas também aparenta ter sido feita com um tratamento incrível. Por mais que só apareçam por pouquíssimos instantes — algumas, apenas por um punhado de segundos — percebemos o cuidado ao se basear nas ilustrações originais. As sugestões do del Toro se mostram presente através das referências visuais como, por exemplo, no design de uma criatura que, direta ou indiretamente, inspira-se no alienígena medonho de 'Estranhas Metamorfoses' (1982). As atuações, talvez, incomodem um pouco. A maioria do elenco parece não saber exatamente o que fazer em cena ou estar desconfortável em seus respectivos papéis — destaco positivamente aqui Austin Zajur que consegue atribuir carisma ao personagem completamente batido que ofereceram a ele —, mas isso provavelmente está relacionado diretamente ao maior problema do filme. “Qual seria esse problema?”, você me pergunta. Logicamente, estou me referindo a ele mesmo: o roteiro.

A solução encontrada para a junção das diversas histórias dos livros em apenas uma narrativa é até engenhosa: um fantasma que escreve histórias premonitórias e que, ao fim, transformam-se em realidade. Contudo, a forma como ela é desenvolvida é constrangedoramente preguiçosa descambando em um punhado de clichês e decisões sem importância o que transforma o filme em mais um exemplar genérico de terror. Seus protagonistas possuem pouco ou nenhum desenvolvimento, a ponto de não nos importarmos (de fato, até desejarmos!) quando a criatura da vez surge para trucidá-los. O fato das histórias serem baseadas no folclore e grande conhecidas pelos fãs do gênero de terror não melhora a situação. Em uma das sequências, uma das personagens tem aranhas saindo de seu rosto; um acontecimento que já vimos de forma semelhante em obras pouco inspiradas como 'Lenda Urbana 3 - A Vingança de Mary' (2005). A ambientação nos EUA da década de 1960 não influencia em nada na trama principal e parece ser utilizada apenas para acompanhar esse novo movimento de obras de horror/fantasia protagonizadas por pré-adolescentes e que se desenrolam em épocas passadas da história norte-americana. Para falar a verdade, influencia, sim, na irrisória construção da motivação de um de seus personagens principais. Por mais que o roteiro seja verborrágico e coloque seus personagens falando sobre seus desejos, medos e sentimentos em voz alta a todo o momento, ao fim parece que não conseguimos conhecer nenhum deles mais profundamente do que o filete de profundidade oferecido. Uma verdadeira pena, porque a história trata de questões interessantíssimas em seu cerne como as consequências da manipulação mentirosa da mídia.

‘Histórias assustadoras para contar no escuro’ é um filme que pode agradar especialmente ao público juvenil e aos críticos de 'It: A Coisa' (2017) do Andy Muschietti. Nele não há desenvolvimento de personagem além dos lugares-comuns do gênero, nenhuma surpresa narrativa e bastantes jump scares. A história se constrói de forma diametralmente oposta a do palhaço assassino por mais que guarde bastante similaridades. Em ‘Histórias...’, os espectadores não poderão acusar a obra de ser um “drama” ou uma “aventura” como alguns se queixaram da obra de Muschietti durante o lançamento. Todavia, não poderão chamá-la de “bom filme” tampouco.

PS: Aconselho todos a ficarem para os créditos finais e apreciarem uma das melhores coisas do filme: o cover da Lana Del Rey para 'Season of the Witch'.

Trailer:



Escrito por Pedro Alves

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