[News] Entre a exaltação da amizade e a antropofagia modernista, Naculudu lança seu primeiro álbum
Entre a exaltação da amizade e a antropofagia modernista, Naculudu lança seu primeiro álbum
O projeto é integrado por Leo Fazio, Marina Mole e Wesley Castellano
Leo Fazio, Marina Mole e Wesley Castelhano formam a Naculudu -
Três amigos prestes a se despedirem por tempo indeterminado decidem gravar um álbum: essa é a maneira mais simples de explicar o nascimento de Naculudu, banda formada por Leo Fazio, Marina Mole e Wesley Castellano. O grupo acaba de lançar seu álbum de estreia, Gambiarra Pra Cachola. Atualmente, eles vivem em países diferentes: Leo, na Argentina; Marina, em Portugal; e Wesley, no Brasil. O disco registra o último mês de encontros entre o trio e reflete a antropofagia modernista que surge a partir de suas referências: a música de Geraldo Vandré e de George Harrison, o cinema novo de Glauber Rocha, o simbolismo de Baudelaire e a sociologia de Gilberto Felisberto Vasconcellos. Ouça aqui.
Nascido no fim de 2021, ainda em meio à pandemia, o projeto começou com Leo e Wesley, amigos desde o ensino médio – e co-fundadores da banda Molodoys junto com Camilla Araújo. Fazio estava prestes a se mudar para Buenos Aires quando os dois decidiram trabalhar em composições que estavam guardadas ou incompletas. O processo de gravação de um álbum se consolidou quando a multiartista Marina Mole, que já integrava o projeto solo de Fazio, se uniu à dupla. Eles formaram juntos a Naculudu, termo que saiu de um vídeo viral de uma batalha de rima de dois moçambicanos, como explica Wesley: “Ouvimos a palavra e amamos a sonoridade. Com uma busca rápida na internet, encontramos um belo significado: ‘Eu rezo por você’. Descobrimos em seguida, através de um vídeo de um angolano, que ‘naculudu’ era simplesmente uma raça de um pato em Moçambique. Mas ficou”.
Entre encontros de despedida e improvisos musicais baseados nas experiências compartilhadas pelos três, novas composições foram surgindo, mesclando interesses e paixões mútuas e próprias de cada um. Outros amigos foram se juntando durante as gravações: o disco tem contribuições de Camilla Araújo, Leon Sanchez, fluiz e Lucas Monch. As composições ganharam novas camadas, consolidando um trabalho de caráter coletivo. Nascia, assim, o álbum Gambiarra Pra Cachola, nome que recupera, agora em chave anti-imperialista, um título de um disco natimorto dos idos de 2010, quando Leo Fazio e Wesley Castellano sonhavam com a gravação de suas primeiras composições. "Mesmo sendo um projeto intermitente, Naculudu tem uma grande vantagem: por não estar vivo (dada a distância que agora separa seus integrantes), ele nunca poderá morrer", divide Wesley.
Capa do álbum Gambiarra Pra Cachola por: Marina Mole - download aqui
A capa surgiu a partir de uma fotografia tirada por Leo Fazio, de um momento em que Marina Mole estava deitada no colo de Wesley Castellano. Ao lado dos dois está o livro "A Bagaceira", de José Américo de Almeida, que Wesley utilizou como referência. Da cabeça – ou cachola – de Marina nasce uma flor, simbolizando tudo que floresceu a partir dos encontros do trio.
Faixa a faixa
O disco se inicia com a faixa Ibiquara, 112, um fragmento dos dias vividos no bairro da Lapa, em São Paulo, onde gravaram algumas das faixas: sob o barulho de uma forte tempestade, ouvimos Wesley cantando "Arueira", de Geraldo Vandré, enquanto lava a louça. A captação do áudio, feita por Leo Fazio com um celular, captura uma coincidência inusitada que se torna uma metáfora para o álbum – um trovão estoura no exato momento em que a letra de Vandré nos fala da mudança que há de vir, como uma promessa que se eterniza em um instante corriqueiro.
Em seguida, em Que Assim Seja E Assim Será, ouvimos uma combinação de viola caipira e guitarra acompanhando os versos de Fazio, com backing vocal de Marina. A música segue crescendo até mergulharmos em um leque de vozes, gritos, gemidos, graves e agudos. “Que Assim Seja E Assim Será é precisamente o que o diz o título: aceitar a vida e suas tristezas, aceitar o sentimento de estar perdido nesse mundo tão maluco. É sobre olhar para trás, juntar as próprias bagagens, depois olhar o resto do caminho e seguir”, comenta Leo Fazio.
Depois de toda a densidade da faixa anterior, Borderline Nightmare Baudelaire nos oferece uma melodia divertida, complementada por uma breve linha de gaita. Os versos surrealistas estão divididos em três partes, cantadas, respectivamente, por Leo, Marina e Wesley, narrando as desventuras da integrante Marina Mole por meio de simbolismos que refletem um período difícil de sua vida. "À época da criação dessa música eu vivia um momento turbulento. Rir de tudo que estava acontecendo junto com os meus amigos foi uma forma de lidar com as situações. O Leo Fazio começou espontaneamente a cantar 'Marina onde foi que você se meteu' e assim me transformei numa anti-heroína", explica.
Em seguida, Bagaceira – canção que surge a partir da leitura do livro "Folclore: Socialismo no Povo", de Gilberto Felisberto Vasconcellos – começa com uma linha circular de um xilofone e uma experimentação vocal que remete aos sons do trabalho repetitivo e alienante. Repleta de expressões retiradas da literatura regional e modernista brasileira, a letra nos fala do cotidiano de trabalhadores explorados e das revoltas e lutas de libertação, recordando uma das formas utilizadas pelos escravizados para se rebelarem contra os senhores: o fogo no canavial.
A leveza retorna em Nem Cola Debaixo do Pé, composição de Leo Fazio que nos leva às origens das festividades de junho e só pede uma coisa ao ouvinte – que ele dance e cante junto. Nesta faixa, podemos ouvir o resultado de algumas parcerias: o sanfona de Leon Sanchez e a linha de baixo de Camilla Araújo, que ainda contribui com backing vocals.
A penúltima faixa, Mim Dê Amor, inspirada em "Give Me Love", de George Harrison, traz uma doce melodia com uma letra que complexifica o modo como o músico britânico abordava o tema. No final, com a modulação do refrão, a letra vai ganhando sentidos dúbios, que transparecem na forma como cada uma das vozes canta os versos. “É uma profanação abrasileirada de um mantra do amor”, comenta Wesley sobre a composição de seu parceiro, Leo Fazio.
O disco se encerra com Fanum Forrobodó, um aboio de vaqueiros que culmina em um “forró metafísico”, como descreve Wesley Castellano. A letra da música apresenta referências diretas ao filme “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, do cineasta brasileiro Glauber Rocha.
OUÇA AQUI
MATERIAL DE DIVULGAÇÃO AQUI
TRACKLIST
1- Ibiquara, 112
2- Que Assim Seja e Assim Será
3- Borderline Nightmare Baudelaire
4- Bagaceira
5- Nem Cola Debaixo do Pé
6- Mim Dê Amor
7- Fanum Forrobodó
FICHA TÉCNICA
Gambiarra Pra Cachola, um disco de Naculudu, 2023
Composição: Leo Fazio, Marina Mole e Wesley Castellano
Vozes: Leo Fazio, Marina Mole e Wesley Castellano
Backing vocals: Camilla Araújo, fluiz e Gabi Jacques
Viola caipira: Leo Fazio
Baixo: Camilla Araújo e Leo Fazio
Guitarra: Leo Fazio, Lucas Monch e Leon Sanchez
Sanfona: Leon Sanchez
Gaita: Leo Fazio
Programação e produção musical: Leo Fazio
Capa: Marina Mole
LINKS NACULUDU
LINKS LEO FAZIO
LINKS MARINA MOLE
LINKS WESLEY CASTELLANO
SOBRE LEO FAZIO
Descrito pela NPR Music como um "brilhante compositor experimental com um talento especial para inovar, em giros excêntricos e eletrizantes, a música tradicional brasileira", Leo Fazio é um músico e performer paulistano não-binário que trabalha em um amplo espectro de expressões musicais experimentais. Em 2017, lançou seu primeiro trabalho solo, o EP Três Por 1 Real. Seu primeiro disco, Sangue Pisado & A Música do Século XXI, foi descrito como um "clássico do século XXI" pelo jornal português Público. Lançou em 2022 o álbum Paranoia, com participações de Luiz Caldas, Dieguito Reis, Alice Marcone, Marina Mole, Lau e Eu, Marcelle, Gabrielle Joie, entre outros. Este ano lançou seu terceiro álbum de músicas autorais, CYBORGIAS. Leo Fazio é também ator, tendo integrado o elenco da série da Netflix Boca a Boca e o espetáculo Dylan! A Musical Biography.
SOBRE MARINA MOLE
Marina Mole é uma multiartista brasiliense com base em Portugal. Atua entre as áreas das artes visuais e audiovisuais, da música, da poesia e da comunicação. Desde 2014 se debruça sobre uma pesquisa a respeito do movimento surrealista, suas ramificações no Brasil e no mundo. Editou, ao lado do poeta e tradutor Guilherme Ziggy, a publicação "Pororoca" (2018), vinculada à Biblioteca Roberto Piva; além de ter seus poemas publicados em revistas literárias. Fundou, em 2019, a produtora Mole Enterprise, que atua na área da música, tendo trabalhado com artistas como Luisa e Os Alquimistas, Baby, Luê, DuSouto, Monch, The Outs, Lau e Eu, entre outros. Em 2022, lançou seu primeiro álbum solo: Perdi As Track Só Tem Demo. Integrou a banda de Leo Fazio como backing vocal e gravou vozes em seu álbum "Paranoia".
SOBRE WESLEY CASTELLANO
Nascido em São Paulo, teve seu primeiro contato com a música através das apresentações de sua mãe flautista. É co-fundador da banda Molodoys com Leo Fazio e Camilla Araújo, e participou da gravação do primeiro EP da banda, Metamorphic Fragments, de 2012. É pesquisador de cinema desde 2019 e finalizou sua dissertação de mestrado na Universidade de São Paulo (USP) sobre o diretor Ken Loach, em 2022. Faz parte do coletivo audiovisual Kino Trincheira, que atua na Zona Leste da cidade de São Paulo organizando oficinas em ocupações e produzindo curtas experimentais baseados em experiências dos espaços de luta. Atualmente, busca retomar os estudos musicais e encontrar um novo instrumento para se apaixonar.
Nenhum comentário