[News] O livro de poesias O gosto amargo dos metais e o romance Siríaco e Mister Charles são os vencedores do Oceanos – Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa

 O livro de poesias O gosto amargo dos metais e o romance Siríaco e Mister Charles são os vencedores do Oceanos – Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa


 

Os autores das obras premiadas são a poeta suíça naturalizada brasileira Prisca Agustoni

e o escritor cabo-verdiano Joaquim Arena. Os vencedores foram anunciados em cerimônia realizada neste dia 7 de dezembro, em São Paulo, no Itaú Cultural, com transmissão pela internet


 

Siríaco e Mister Charles, do cabo-verdiano Joaquim Arena, editado pela Quetzal, foi anunciado vencedor, durante cerimônia na Sala Vermelha do Itaú Cultural, pelo Embaixador de Portugal no Brasil, Luís Faro Ramos, que, em seguida, puxou uma conversa online com o autor. O superintendente do Itaú Cultural, Jader Rosa, anunciou O gosto amargo dos metais, da suíça naturalizada brasileira Prisca Agustoni, editado pela 7 Letras. Na sequência, ele chamou a poeta ao palco e lhe deu a palavra.

 

“Meu livro trata do eco crime de Mariana e Brumadinho. Senti necessidade de escrever, porque a ideia de um rio que morreu nunca tinha atravessado a minha imaginação. Diante do impacto dessa notícia e das imagens que a seguiram, nos dias e nas semanas após essa tragédia, senti um profundo silenciamento interno”, disse Prisca. “Achei que através da poesia poderia tentar trazer uma palavra que pudesse dar uma luz, como se fosse um processo de regeneração da palavra, daquilo que nos é mais caro e mais frágil, que é a nossa percepção do mundo. Acho que a poesia foi o caminho que encontrei para tentar recuperar uma voz atordoada e silenciada após o impacto e de tantas mortes”, completou.

 

“Eu nasci em Cabo Verde e minha primeira língua, até os cinco ou seis anos, foi o crioulo. Depois imigramos para Portugal e nos tornamos completamente portugueses ‘fora de portas’, ou seja, éramos caboverdianos dentro de casa, comíamos, bebíamos e cantávamos e riamos como caboverdianos, mas, fora, éramos portugueses. A nossa mãe falava em português conosco, só de vez em quando falava em crioulo. Penso que o Brasil é o Brasil, Cabo Verde é Cabo Verde, por causa dessa troca de experiências, desse movimento de povos para sul, norte, leste, oeste. Isto faz parte também da literatura”, disse Arena.

 

“A literatura é feita da contação de histórias, que são momentos vividos por pessoas que se deslocam ao longo da nossa história e da história do Atlântico. Os povos foram misturando-se e viajando e é a partir daí que vem todas essas experiências, trocas e essa miscigenação que somos nós caboverdianos, os brasileiros e até, também, os portugueses, que tiveram uma população de pessoas levadas de África para Portugal e chegaram a constituir 10% da população de Lisboa. Portanto, o sangue africano está entre nós e isso reflete esse movimento e esse encontro de culturas e povos. Homens e mulheres que foram se cruzando ao longo do século”, concluiu.

 

O encontro, que pode ser assistido aqui, foi conduzido pela atriz Fernanda D’Umbra e teve performance da slammer Luz Ribeiro e apresentação do escritor Santiago Nazarian, jurados desta edição do Prêmio. Selma Caetano, diretora da Oceanos Cultura, responsável pela gestão da premiação, abriu a cerimônia.

 

Estiveram presentes, ainda, o Cônsul-Geral de Portugal em São Paulo, António Pedro Rodrigues da Silva e a Diretora do Instituto Camões no Brasil, Alexandra Pinho, além de jurados da premiação e dos poetas brasileiros finalistas Claudia Roquette-Pinto, Guilherme Gontijo Flores e Prisca Agustoni.

 

“O Prêmio Oceanos é um trabalho coletivo constante de promoção da língua portuguesa, e existe para colocar os leitores diante da produção literária da geração contemporânea de escritores do idioma – geração esta que é muito bem representada pelos 10 livros finalistas de 2023” diz Selma. “Títulos que, sem exceção, nos arrancam da imobilidade ao reconhecer e denunciar traumas passados e recentes, e apontar novas perspectivas”, completa.

 

“A cada edição percebemos um amadurecimento do Oceanos, ainda mais próximo do que pensamos desde o início: promover um real e efetivo intercâmbio entre editores e autores dos países de língua portuguesa. O resultado em 2023 fortalece este propósito”, diz Jader Rosa, superintendente do Itaú Cultural. “A novidade desta edição – dividir as categorias entre prosa e poesia, com dois júris diferentes para avaliar os inscritos – é mais um passo nessa direção.”

 

Júri

 

Para chegar ao resultado de prosa, um júri composto pelos brasileiros André Sant'Anna, Eliane Robert Moraes, José Castello, Schneider Carpeggiani, pelo moçambicano Nataniel Ngomane e pela portuguesa Clara Rowland leu os cinco romances finalistas. O júri para chegar à vencedora  de poesia, foi formado pelos brasileiros Célia Pedrosa, Maria Esther Maciel, Tatiana Pequeno e pelos portugueses Carlos Mendes de Sousa e Golgona Anghel, que também leram as obras dos cinco finalistas de poesia. Ao todo, participaram do processo de avaliação 159 jurados de quatro diferentes países. A lista completa está disponível aqui.

 

Além do livro vencedor, os finalistas de poesia foram Alma Corsária, de Cláudia Roquette-Pinto (34), Diário da encruza, de Ricardo Aleixo (Segundo selo), Entre costas duplicadas desce um rio, de Guilherme Gontijo Flores (Ars et Vita), O gosto amargo dos metais, de Prisca Agustoni (7Letras) e Paraíso, de Pedro Eiras (Assírio & Alvim).

“Os livros de poesia finalistas desta edição do Oceanos trazem uma característica comum à produção contemporânea de dialogar com a tradição e, ao mesmo tempo, lançar cada vez mais um olhar crítico para questões sociais e políticas, em uma confluência de rigor estético e ético”, diz Manuel da Costa Pinto, curador do Oceanos no Brasil, que também esteve presente na cerimônia.

 

Os finalistas de prosa apresentados pelo escritor Santiago Nazarian foram A história de Roma, de Joana Bértholo (Caminho), A última lua de homem grande, de Mário Lúcio Sousa (Dom Quixote), Misericórdia, de Lídia Jorge (Dom Quixote) e Naufrágio, de João Tordo (Companhia das Letras Portugal).

“Entre os finalistas de prosa, é de ressaltar a diversidade temática e de estilo. Destes temas tidos como urgentes na atualidade, como o lugar da mulher no mundo, o envelhecimento ou ou o abuso, a assuntos mais universais onde se incluem o lugar da memória, a herança coletiva o confronto entre visões diferentes do mundo ou a ideia de viagem enquanto constitutiva da ideia de literatura”, observa Isabel Lucas, curadora do Oceanos em Portugal. “Do experimentalismo de alguns livros, ao formato mais canónico de outros, sobressai ainda a procura de novas formas de linguagem capazes de transpor uma inquietação muito deste tempo”, conclui ela.

Os vencedores

 

O gosto amargo dos metais, de Prisca Agustoni

A obra nasce do impacto dos crimes ambientais ocorridos em Minas Gerais, primeiro em Mariana e depois em Brumadinho, em que uma avalanche de lama de rejeito de mineração destruiu bairros inteiros, tirou centenas de vidas e tingiu de marrom o rio doce, um dos mais importantes do Brasil. “As imagens terrificantes que circularam me lembraram uma tragédia de proporções épicas, como se o mundo estivesse vivendo um novo fim – e, paradoxalmente, um estranho recomeço”, diz a autora no prefácio do livro.

Prisca Agustoni (1975) é poeta, tradutora e professora de literatura na faculdade de Letras na Universidade Federal de Juiz de Fora. Nascida na Suíça e vivendo no Brasil, escreve e se autotraduz em italiano, francês e português. Suas publicações mais recentes são Un ciel provisoire, Casa dos ossos, animal extremo, O mundo mutilado, L’ora zero e Língua sommersa.

 

 

Síriaco e Mister Charles, de Joaquim Arena

 

O livro conta a história de uma amizade ficcional entre dois personagens reais. De um lado, o jovem cientista Charles Darwin. De outro, Siríaco, um desconhecido homem negro, ex-escravizado, que nasceu no Brasil, foi educado em Portugal e, por ter a pele marcada por vitiligo, integrou a chamada “corte exótica” da Rainha Dona Maria I, composta ainda por indígenas e pessoas com nanismo. No romance, os dois se encontram em Cabo Verde (e aqui tudo já é ficção), lugar em que Siríaco decidira viver após ancorar na Ilha de Santiago com a família real durante a fuga de 1807, e onde Darwin passou 16 dias no início de suas investigações naturalistas que teriam como resultado o livro A Origem das Espécies.

 

Joaquim Arena é escritor e formado em Direito, em Lisboa. Nascido na Ilha de São Vicente, em Cabo Verde, é filho de pai português e mãe cabo-verdiana. Foi assessor do presidente Jorge Carlos Fonseca até 2021. A Verdade de Chindo Luz foi o seu primeiro romance, depois publicou Debaixo da Nossa Pele, um ensaio-reportagem sobre os seus antepassados, escravos e trabalhadores livres nos campos de arroz do Vale do Sado.

 

Novidades da premiação

 

Pela primeira vez na história do prêmio, as inscrições foram divididas entre prosa e poesia e foram formados dois júris diferentes para avaliar os inscritos de poesia e os de prosa/dramaturgia. Entre 1.188 inscritos de poesia foram selecionados 21 semifinalistas e depois, entre esses, cinco finalistas. Entre 1.466 de prosa, foram selecionados 20 semifinalistas e depois, entre esses, cinco finalistas. A novidade  da edição 2023 do Oceanos – Prêmio de Literatura em Língua Portuguesa, que teve recorde de inscrições, culminou com a divulgação dos dois vencedores: um de prosa e outro de poesia, que recebem R$ 150 mil cada.

 

O prêmio

 

O Oceanos é realizado via Lei de Incentivo à Cultura, pelo Ministério da Cultura, e conta com o patrocínio do Banco Itaú, da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas da República Portuguesa, do Instituto Cultural Vale, do Magazine Luiza e do Skeelo; o apoio do Itaú Cultural, da Biblioteca Nacional de Moçambique e do Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas de Cabo Verde; e o apoio institucional da CPLP.  O Prêmio Oceanos é administrado pela Associação Oceanos e pelo Itaú Cultural.


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